Por Michel Oliveira (estagiário)
Das pinceladas emergem memórias. Recordações de um passado não muito distante, quando o Natal ainda era marcado pela roda gigante e pelo carrossel de Seu Tobias, montados ao lado da Catedral. Nas telas, a religiosidade: as procissões, a imagem dos santos de devoção. Na mistura das cores, o retrato do cotidiano, a cultura do povo. Histórias de casarios coloniais, contadas das janelas.
Essas são algumas das impressões daqueles quem detém o olhar sobre as obras de Anete Sobral, expostas na Galeria de Arte Álvaro Santos. A exposição intitulada ‘Anete Sobral – Visão Urbana e Cultural’ é uma homenagem póstuma a um dos grandes destaques da pintura sergipana.
Até 11 de dezembro, o público pode conferir as 32 telas e os dois estandartes pintados pela artista. Para Luís Adelmo, diretor da galeria, essa é uma oportunidade de reavivar a memória do público e fazer com que mais pessoas conheçam suas obras. “É uma obrigação dos agentes culturais fazer com que as pessoas não esqueçam o passado. É preciso manter viva a imagem de grandes artistas como Anete Sobral”, argumenta.
Emoção
Durante a abertura da mostra, na noite dessa quinta-feira, 25, familiares e amigos prestaram homenagens e relembraram momentos que viveram com a pintora. Eduardo Sobral, filho da artista, disse estar muito agradecido pela exposição. “É uma grande alegria apresentar ao público a obra de minha mãe. É impossível não se emocionar ao ver seus trabalhos expostos de maneira tão digna”, destacou.
Luiz Alberto do Santos, professor de antropologia, contou que teve a oportunidade de conhecer a artista. Segundo ele, Anete Sobral era uma mulher alegre, que acreditava muito em Deus. “A pintura tem muito a ver com a alma do artista. A obra reflete o espírito dela, feliz, de bem com a vida. Me surpreende a forma como ela capta o cotidiano, é um olhar muito próprio. Anete tem um traço que marca. Ela foca o olhar das personagens, o gesto, as cores. Você olha e sente a atmosfera do passado”, analisou.
Memórias
O filho da artista revelou que a obra de sua mãe é um reflexo do que ela viveu. No início da carreira artística, ela se dedicou aos casarios coloniais, viajando pelo interior do estado para registrar a arquitetura, principalmente na região do Baixo Cotinguiba. Depois ela volta seu olhar para o folclore e manifestações populares, retratando as festas de São João, a feirinha de Natal do Parque Teófilo Dantas, as procissões que passavam em frente a sua casa, em direção à Catedral. “Cada pintura é a memória de um tempo, imagens que ficaram em seu imaginário. É uma obra muito autoral”, lembrou Eduardo.
Para o historiador Luiz Antônio Barreto, a arte de Anete Sobral não pode ser avaliada apenas pela linguagem da sua expressão, mas também pelo inventário que ela apresenta, nas telas, do cotidiano e do povo sergipano. “Poucos artistas conseguiram fixar, de forma tão perfeita, a dinâmica popular que nas igrejas, nas ruas e nas paisagens revela a alma de nossa gente. É um testemunho do gesto criador do povo de Sergipe”, concluiu.
Doação
A noite de abertura foi marcada ainda pela doação do retrato do médico e pintor Aécio Cardoso para o acervo permanente da Galeria de Artes Álvaro Santos. O quadro, pintado por Carlos Bastos, foi doado pela família de Aécio, representada pela irmã do artista, Uilma Amazonas, que atualmente mora em Salvador. Ela conta que é uma honra doar o retrato de seu irmão para a galeria.
Foi lá que Aécio expôs pela primeira vez, em 1975, por isso a irmã convenceu a família a doar a obra para a Álvaro Santos. “Tem uma coisa simbólica. Vejo essa doação por duas óticas: uma é afetiva e familiar. A outra é pela questão cultural, de proporcionar que o público tenha acesso ao quadro”, comentou Uilma.
A Galeria de Artes Álvaro Santos fica localizada na Praça Olímpio Campos, no Centro de Aracaju. O horário de visitação é das 8h às 18h, de segunda à sexta, e das 9h ás 13h no sábado.