Assistência Social garante superação da extrema pobreza e sonhada graduação superior

Assistência Social e Cidadania
19/01/2023 07h30

Da situação de extrema pobreza à conclusão do batalhado curso de graduação em pedagogia. Agora pedagoga, Carla Pereira Barros, assistida pelo Centro de Referência da Assistência Social (Cras) Enedina Bomfim, encontrou no equipamento socioassistencial gerido pela Prefeitura de Aracaju o porto seguro que faltava para mudar o rumo da sua história de vida.

Aos 36 anos, ela conta que a jornada universitária durou "exatamente quatro anos, oito meses e 19 dias", e foi encerrada na noite da última quarta-feira, 18, em solenidade de formatura realizada no Campus São Cristovão da Universidade Federal de Sergipe (UFS), na grande Aracaju.

“Estou muito feliz, é muita emoção para uma pessoa só. Achei que meu coração fosse sair pela boca quando fui pegar o meu canudo. Talvez hoje eu não estivesse aqui para contar a minha história se eu continuasse a viver a vida que eu levava. Agradeço a Deus por ele ter colocado anjos, não digo nem pessoas, mas anjos na minha vida que encontrei no Cras, pessoas que me incentivaram para eu seguir em frente. Elas representam a minha segunda família”, reconhece a nova pedagoga.

Acolhimento socioassistencial
As pessoas a quem Carla se refere são profissionais do Cras Enedina Bomfim, no Bairro América, que a acolheram ainda sem saber o motivo pelo qual ela passou a usufruir dos serviços ofertados na unidade da Proteção Social Básica do Sistema Único de Assistência Social. A pedagoga vivia em situação de extrema pobreza, sofria de violência doméstica do ex-marido e não tinha esperanças até algumas de suas amigas fazerem o convite para conhecer o espaço.

“Foi no Cras que recebi apoio e me senti segura para tomar a decisão da separação. Depois, Vanessa Côrtes [psicóloga do Cras] me perguntou até que série eu havia estudado, disse: terceiro ano completo do ensino médio. Ela me incentivou a fazer o Enem e buscar a Universidade Federal. Fiz duas vezes e não passei. Na terceira, passei em quinto lugar em pedagogia”, relata Carla.

Atualmente, Carla é beneficiária de programas sociais federais e municipais, a exemplo do Auxílio Brasil, Auxílio Moradia, cesta básica, além de receber acompanhamento pelo Paif, junto às suas três filhas, que durante muitos anos fizeram parte do Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV).

Por meio da parceria com a Fundação Municipal de Formação para o Trabalho (Fundat), ela foi encaminhada para diversos cursos profissionalizantes, e aprendeu a produzir bolos, doces, salgados, produtos natalinos, a manipular alimentos, pintar em tecido, trabalhar como manicure, conhecimentos que lhe abriram um leque de novas possibilidades.

“Eu tenho dois sonhos: um era ser professora - que já realizei - e o outro é abrir a minha confeitaria. Sou fielmente grata porque tive muita ajuda em todas as áreas da minha vida, pessoal, financeira, em casa com a família. Através delas fiz vários cursos na Fundat e consegui aumentar a minha renda fazendo salgados para festas por encomendas”, relatou.

Atendimento efetivo
A coordenadora do Cras Enedina Bomfim, Elisabete Ribeiro, não se conteve em lágrimas ao ver o resultado do trabalho em equipe.

“Ela absorveu todas as orientações que recebeu em nosso grupo de mulheres e isso fez uma grande diferença. O Cras apostou que ela conseguiria e hoje é dia de festejar essa vitória que não é apenas de Carla, mas do Cras Enedina Bomfim que cumpriu com o seu papel de levar orientação, incentivo e dizer que é possível chegar onde ela chegou. O conhecimento é capaz de transformar vidas e hoje vimos essa transformação. Estou tão emocionada quanto a mãe de Carla porque ela foi um embrião gerado dentro do nosso espaço, e que hoje vimos brotar em uma universidade federal”, disse emocionada.

De acordo com a psicóloga do Cras, Vanessa Côrtes, escolhida por Carla para ser sua madrinha na cerimônia, a usuária já é assistida há cerca de dez anos e sempre se mostrou participativa nos encontros do grupo de mulheres acompanhadas pelo Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (Paif), além de integrar outros serviços, ações e projetos desenvolvidos na unidade.

“Então víamos que ela tinha um potencial. Questionamos sobre o seu nível de escolaridade e sugerimos a sua inscrição no Enem. Mesmo já tendo concluído o ensino médio, Carla teve a ideia de voltar à escola para se reciclar. Quando foi aprovada, ficamos mais felizes do que ela. É emocionante ver que ela conseguiu porque não é fácil você entrar em uma faculdade federal tendo três filhos, marido e uma condição de vida difícil. Carla sempre teve disposição para correr atrás dos sonhos dela, mesmo que cursar o nível superior não tenha sido um sonho na época, mas porque nunca ninguém tinha mostrado que isso era possível”, relatou.   

Família
Seu percurso não foi fácil. Durante o curso, Carla enfrentou dificuldades. A primeira delas foi a distância. Sem recursos financeiros, ela caminhava quase quatro quilômetros, cerca de 40 minutos até chegar à Universidade, barreira interrompida após a equipe do Cras encaminhá-la para o serviço de emissão de passe escolar. Casada, seu atual esposo descobriu um câncer, mas isso não a fez desistir, mesmo tendo o hospital como o seu segundo local de estudos durante quatro meses.

“Era da Universidade para o hospital, do hospital para a Universidade. Diante de tudo, hoje posso dizer que sou uma professora formada, graças ao incentivo das meninas do Cras. Tive chances de desistir, mas preferi continuar porque quando eu olho para trás, faço a comparação da mulher que eu era para a mulher e mãe que me transformei. Hoje estou totalmente mudada, mais madura. No meu pensamento não existe mais a palavra desistência, e sim, persistência, porque desistir é para os fracos e persistir é para os fortes”, indagou.  

O pedreiro Genildo Santos, atual companheiro de Carla, prestigiou a formatura ao lado de suas enteadas. Para ele, sua esposa é exemplo de força e determinação. “Foi uma fase que só nós dois sabemos o quanto foi difícil. Ela é uma mulher guerreira, merece estar aqui porque lutou para isso. Está de parabéns. As amizades que ela construiu no Cras ajudaram muito. Estou sem palavras, é um momento muito especial”, rememorou, emocionado.

Visando um futuro promissor, Carla está em busca de sua primeira oportunidade de emprego na área, desta vez, como profissional graduada em pedagogia. “Já tive algumas experiências em escolas municipais de Aracaju e de outros municípios, onde me identifiquei muito com a minha profissão. Daqui para frente eu entrego nas mãos de Deus. Já me inscrevi em concursos e agarrarei todas as oportunidades que me aparecerem. A luta continua”, finalizou.